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Extrato Etanólico de Cascas Recicladas de Pequi (Caryocar brasiliense, Camb.) Induz Apoptose em Células de Osteossarcoma Canino

Resumo

O osteossarcoma é uma neoplasia mesenquimal associada à alta mortalidade em cães e humanos. O pequi (Caryocar brasiliense, Camb.) é nativo do Cerrado, bioma rico em biodiversidade predominante na região Centro-Oeste do Brasil. Embora esta planta seja frequentemente utilizada na medicina popular, as propriedades farmacológicas da casca do pequi ainda são pouco conhecidas. Este estudo teve como objetivo determinar a atividade citotóxica do extrato etanólico de cascas de pequi recicladas em células de osteossarcoma canino. As células foram cultivadas e tratadas com concentrações finais de extrato de zero, 0,029 µg/µL, 0,29 µg/µL e 2,91 µg/µL por 24, 48 ou 72 horas. As células foram submetidas a ensaio de viabilidade celular pelos métodos de exclusão de azul de tripano da redução de tetrazólio para determinar a IC50, ao ensaio de sobrevivência celular para calcular a fração de sobrevivência e à dupla marcação com anexina V e iodeto de propídio para determinar o tipo de morte celular. O extrato etanólico de casca de pequi na concentração de 2,91 µg/µL apresentou a maior inibição do crescimento de células de osteossarcoma, com redução de 71,80% no crescimento em relação ao controle. A IC50 média foi de 155,2 μg/mL em 72 horas. O crescimento celular em 72 horas foi 3,33% menor nas células tratadas com 2,91 µg/µL de extrato. A apoptose foi o tipo predominante de morte celular em células tratadas com 2,91 µg/µL de extrato. Esses resultados demonstram que o extrato etanólico de cascas de pequi recicladas promove apoptose em células de osteossarcoma canino.

Palavras-chave:
Antineoplásico; Cerrado; D-17 osteossarcoma canino; sustentabilidade; taninos

Abstract

Osteosarcoma is a mesenchymal cancer associated with high mortality in dogs and in humans. The biodiversity-rich Cerrado, the predominant biome in the Midwest region of Brazil, is native to locally appreciated fruits such as pequi (Caryocar brasiliense, Camb). Although this plant has been frequently used in folk medicine, the pharmacological properties of pequi fruit shells have not been fully evaluated. Thus, this study aimed to determine the cytotoxic activity of ethanol extract of recycled pequi shells on canine osteosarcoma cells in vitro. Cells were cultured and treated with final extract concentrations of 0, 0.029 µg/µL, 0.29 µg/µL, and 2.91 µg/µL for 24, 48, or 72 hours. Cell viability assay using trypan blue exclusion method and tetrazolium reduction method, cell survival assay, and double labeling with annexin V and propidium iodide were performed in the treated osteosarcoma cells. These allowed the determination of IC50, survival fraction, and type of cell death, respectively. Pequi shell ethanol extract at a concentration of 2.91 µg/µL showed the greatest inhibition of osteosarcoma cell growth in vitro, resulting in a 71.80% decrease in growth compared to the control. The mean IC50 was 155.2 μg/mL at 72 hours. The calculated survival fractions showed that cell growth at 72 hours was 3.33% lower in cells treated with 2.91 µg/µL extract. Results from the double labeling experiment suggest that apoptosis was the predominant type of cell death in cells treated with 2.91 µg/µL extract. These results demonstrate that ethanol extract of recycled pequi shells promotes apoptosis in canine osteosarcoma cells.

Keywords:
Antineoplastic; pequi; Cerrado biome; D-17 canine osteosarcoma; sustainability; tannins

Introdução

O osteossarcoma canino é um tumor ósseo primário maligno e agressivo, que apresenta características semelhantes ao osteossarcoma humano e frequentemente resulta em metástase pulmonar(1)1 Wilk SS, Zabielska-Koczywas KA. Molecular mechanisms of canine osteosarcoma metastasis [Internet]. Vol. 22, International journal of molecular sciences. 2021. p. 3639. Available from: https://10.3390/ijms22073639
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. A alta mortalidade associada a esta doença correlaciona-se com sua capacidade metastática, levando à morte em até 80% dos animais. Investigar e desenvolver tratamentos para o osteossarcoma canino é importante não apenas porque inúmeros casos podem ser observados com frequência na prática veterinária, mas também para aprimorar o conhecimento acerca do osteossarcoma humano, devido à semelhança da doença nas duas espécies(2)2 Leonardi L, Scotlandi K, Pettinari I, Benassi MS, Porcellato I, Pazzaglia L. Mirnas in canine and human osteosarcoma: A highlight review on comparative biomolecular aspects [Internet]. Vol. 10, Cells. 2021. p. 1–9. Available from: https://10.3390/cells10020428
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Vários estudos utilizaram plantas como fontes de potenciais compostos bioativos e medicinais, incluindo produtos naturais com potencial inibitório contra células neoplásicas. Estudos in vitro utilizando linhagens de células tumorais têm sido utilizados para identificar componentes bioativos em plantas e fornecer melhor compreensão do mecanismo de ação desses compostos em células neoplásicas(3)3 Cortelo PC, Demarque DP, Dusi RG, Albernaz LC, Braz-Filho R, Goncharova EI, Bokesch HR, Gustafson KR, Beutler JA, Espindola LS. A molecular networking strategy: High-throughput screening and chemical analysis of brazilian cerrado plant extracts against cancer cells. Cells. 2021;10(3):1–13. Available from: https://10.3390/cells10030691
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O Cerrado brasileiro é uma fonte considerável e valiosa de biomoléculas, devido ao seu clima e vegetação característicos de savana. O potencial antitumoral das plantas do Cerrado, principalmente da planta simbólica, o pequi (Caryocar brasiliense, Camb.), pode revelar novas alternativas na terapia antitumoral. Esses tratamentos alternativos podem oferecer melhor eficácia em humanos e animais, com efeitos colaterais mínimos em comparação com os tratamentos antineoplásicos convencionais(3)3 Cortelo PC, Demarque DP, Dusi RG, Albernaz LC, Braz-Filho R, Goncharova EI, Bokesch HR, Gustafson KR, Beutler JA, Espindola LS. A molecular networking strategy: High-throughput screening and chemical analysis of brazilian cerrado plant extracts against cancer cells. Cells. 2021;10(3):1–13. Available from: https://10.3390/cells10030691
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,(4)4 Palmeira SM, Silva PRP, Ferrão JSP, Ladd AABL, Dagli MLZ, Grisolia CK, Hernandez-Blazquez FJ. Chemopreventive effects of pequi oil (Caryocar brasiliense Camb.) on preneoplastic lesions in a mouse model of hepatocarcinogenesis. Eur J Cancer Prev. 2016;25(4):299–305. Available from: https://10.1097/CEJ.0000000000000187
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. Além disso, a diversidade molecular dos produtos naturais é muito superior à derivada de processos sintéticos, possibilitando que compostos químicos presentes nas plantas se tornem potenciais fármacos para diversas doenças(5)5 Nunes C dos R, Arantes MB, de Faria Pereira SM, da Cruz LL, de Souza Passos M, de Moraes LP, Vieira IJC, de Oliveira DB. Plants as Sources of Anti-Inflammatory Agents [Internet]. Vol. 25, Molecules. 2020. p. 3726. Available from: https://10.3390/molecules25163726
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Ensaios avaliando a eficácia de metabólitos secundários do pequi em células cancerígenas são valiosos para verificar o potencial preventivo, terapêutico ou mesmo curativo desse extrato em neoplasias, como o osteossarcoma. Além disso, a reciclagem de cascas de pequi, que geralmente são descartadas, contribui para a sustentabilidade dessa abordagem. Esta investigação teve como objetivo determinar a atividade citotóxica do extrato etanólico de cascas de pequi recicladas em células de osteossarcoma canino in vitro.

Materiais e Métodos

Este estudo foi realizado no Laboratório Multiusuário de Avaliação de Moléculas, Células e Tecidos do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal da Faculdade de Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Goiás (UFG), Brasil. Os extratos da casca do pequi foram preparados no Laboratório de Nutrição Animal (EVZ/UFG) e a análise físico-química da composição do extrato foi realizada na Faculdade de Farmácia (UFG).

Cultivo Celular

As células de osteossarcoma (D-17, BCRJ 0276, Lote 000573, Passagem 239) da ATCC (American Type Culture Collection - Manassas, VA, EUA) foram adquiridas do Banco de Células do Rio de Janeiro (BCRJ - Rio de Janeiro, Brasil) e mantidas em incubadora umidificada a 37 ºC e atmosfera de 5% de CO2.

As células foram cultivadas em meio Eagle modificado por Dulbecco (DMEM, Gibco, Weltham, MA, EUA), suplementado com 10% de soro fetal bovino, penicilina, estreptomicina (10.000 U.I./ml - 10 mg/ml), anfotericina B e L-glutamina.

Preparação de Extrato Etanólico de Cascas Recicladas de Pequi

As cascas de pequi foram obtidas no Centro de Abastecimento de Goiás (Ceasa-GO), com cascas selecionadas de uma seleção recém-descartada em perfeitas condições morfológicas (voucher UFG - 43-833, Herbário UFG, Brasil) e em condições ideais de maturação. As cascas foram cortadas em uma espessura de aproximadamente 4 mm e colocadas em estufa de ventilação forçada a 60 °C por 72 horas. As cascas secas foram trituradas em um moinho analítico para obter um tamanho de partícula padronizado de 60 mesh (0,25 mm). O farelo de casca de pequi foi armazenado a –20ºC, protegido da luz.

A extração por percolação a frio foi realizada percolando 1000 g de farelo de casca de pequi em 1000 mL de etanol 95% (etanol 95:5:água) por oito horas e agitado por uma hora. O produto foi centrifugado a 4000 rpm e o sobrenadante filtrado. O solvente foi evaporado em rotaevaporador sob pressão reduzida para obter o extrato etanólico bruto (EECRP). O extrato foi então armazenado a –4°C, protegido da luz para uso posterior. Amostras do EECRP foram submetidas à análise físico-química.

Design experimental

Células de osteossarcoma canino D-17 foram semeadas em placas de 96 poços a 1×104 células/poço com 100 µL de meio e tratadas com solução estoque EECRP (concentração 29,2 µg/µL) para obter as seguintes dosagens finais: 0,029 µg/µL (0,1 µL por poço), 0,29 µg/µL (1/µL por poço) e 2,91 µg/µL (10 µL por poço). Células não tratadas com EECRP (0 µg/µL) foram usadas como grupo controle (GC). As células foram expostas por 24, 48 e 72 horas. Todos os testes foram realizados em triplicata, em três experimentos independentes. Os extratos foram diluídos em DMSO (Dimetilsulfóxido, Cultilab, Campinas, Brasil) e armazenados a –20 ºC.

Ensaios de Viabilidade Celular

Método de Exclusão do Azul de Tripano

As células D-17 foram cultivadas em placas de 96 poços com 100 µL por poço a 1×104 células/poço por 24 horas, dentro de uma incubadora umidificada a 37ºC com 5% de atmosfera de CO2. Os tratamentos foram realizados com dosagens de 0,029, 0,29 e 2,91 µg/µL de EECRP por 24 h (G24), 48 h (G48) e 72 h (G72). O meio de cada poço foi descartado e as células foram suspensas em 100 μL de tripsina (Cultilab, Campinas, Brasil) após lavagem com solução salina tamponada com fosfato de Dulbecco (DPBS, Life Technologies, EUA). As células foram dissociadas com tripsina-EDTA (0,05%), que foi posteriormente inativada pela adição de 100 μL de DMEM. A solução resultante foi centrifugada a 130 rcf (g) por 10 minutos e decantada. As células foram ressuspensas em 100 µL de meio de cultura fresco e 10 µL da suspensão foram transferidos para microtubos do tipo Eppendorf, contendo 40 µL de azul de Tripan (Trypan Blue - Sigma-Aldrich, St Louis, EUA). A viabilidade celular foi avaliada instilando 10 μL de mistura de células-azul de Tripan em uma lâmina, observada em uma câmara de Neubauer sob um microscópio óptico.

A viabilidade celular foi calculada aplicando-se a seguinte equação: % CV = (NC do tratamento/NC do CG) × 100, onde CV é a viabilidade celular e NC é o número de células. Três experiências independentes foram realizadas em triplicado. Os resultados foram analisados por meio de análise de variância (teste F), utilizando-se a ferramenta estatística Microsoft Excel. O nível de significância foi fixado em 0,05.

Método de redução de sal de tetrazólio (MTT)

As células D-17 foram cultivadas e tratadas com EECRP como descrito acima. Após o tratamento, 10 µL de tetrazólio (MTT, brometo de 3-(4,5-dimetil-2-tiazolil)-2,5-difenil-2H-tetrazólio - Sigma-Aldrich) foi adicionado a cada poço. Após incubação por três horas, 50 μL de 10% de dodecil sulfato de sódio (SDS - Vivantis Biochemical, CA, EUA) diluído em 0,01N HCl foi adicionado por poço para interromper a reação de redução de MTT para formazan. As células foram incubadas durante 24 horas à temperatura ambiente. A densidade óptica de cada placa foi quantificada usando um espectrofotômetro (Awareness Technology Ine/Stat Fax 2100, 425 nm – 540 nm, Palm City, FL, EUA). A concentração a 50% de inibição da viabilidade celular (concentração inibitória - IC50, em µM) foi determinada usando o programa estatístico GraphPad Prism (GraphPad Software, San Diego, CA, EUA). Para este teste, três experimentos independentes foram realizados em triplicata.

Ensaio de Sobrevivência Celular

As células D-17 foram cultivadas e tratadas com EECRP como descrito acima. Após o tratamento, o meio de cada poço foi descartado e as células foram suspensas com 500 μL de tripsina. Antes da centrifugação a 130 RCF (g) por 10 minutos, o meio foi descartado e as células foram ressuspensas em 1 ml de DMEM. As células foram então cultivadas em placas de seis poços em uma incubadora umidificada a 37 ºC, com 5% de atmosfera de CO2 por 15 dias.

Após a incubação, o meio foi descartado. Os poços foram lavados com DPBS, tingidos com azul de tripano, colocados dentro de uma câmara de Neubauer e contados. As frações de sobrevivência foram calculadas usando a seguinte equação: %FS = (número CCAT/número CCGC) x 100, onde FS é a fração de sobrevivência, CCAT é o número de células contadas após o tratamento e CCGC é o número de células contadas no CG. As curvas de sobrevivência foram plotadas e os dados foram analisados por meio de análise de variância (teste F).

Três experiências independentes foram realizadas em triplicata.

Ensaio de Dupla Marcação

As células foram cultivadas em placas de 12 poços a 5 × 105 células/poço, dentro de uma incubadora umidificada a 37 ºC com 5% de atmosfera de CO2. As células foram tratadas com 2,91 µg/µL de EECRP por 24, 48 e 72 horas. Ao final do tratamento, o meio de cada poço foi armazenado em tubo de ensaio devidamente rotulado, enquanto as células viáveis foram descartadas. A dupla marcação foi realizada adicionando-se 400 μL de tampão de ligação, 5,0 μL de anexina V-FITC e 1,0 μL de iodeto de propídio (Anexina V Apoptose Detection Kit I - BD Biosciences, San Diego, EUA) a cada tubo de ensaio. A solução resultante foi incubada à temperatura ambiente durante 15 minutos e depois analisada num citômetro de fluxo (FACSVerse, BD Biosciences). Apoptose precoce foi identificada em células marcadas apenas com anexina V, apoptose tardia em células marcadas com anexina V e iodeto de propídio e necrose em células marcadas apenas com iodeto de propídio. Três experimentos independentes foram realizados em triplicata. A análise de variância com o teste de Tukey post-hoc foi usada para comparar a porcentagem média de células positivas para cada combinação (apenas anexina V, apenas iodeto de propídio ou ambos os corantes simultaneamente) usando o pacote easyanova(6)6 Arnhold E. Package in the R environment for analysis of variance and complementary analyses. Brazilian J Vet Res Anim Sci. 2014;50(6):488–92. Available from: https://10.11606/issn.1678-4456.v50i6p488-492
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do software R. O nível de significância foi fixado em 0,05.

Resultados

Para este experimento, foram recicladas 180 kg de casca de pequi, que foram obtidas a partir de 300 kg de frutos e destinadas ao descarte. Isso rendeu aproximadamente 9 kg de farelo de casca de pequi. A extração de 1 kg de farelo de casca de pequi em 1000 mL de etanol 95% e posterior percolação a frio e vaporização rotativa resultou em 450 mL de EECRP, com rendimento de 45%. Os resultados obtidos da análise físico-química do EECRP bruto não diluído são encontrados na Tabela 1.

Tabela 1
Parâmetros físico-químicos do extrato etanólico bruto de cascas recicladas de pequi (Caryocar brasiliense, Camb) utilizado neste experimento. *GAE= equivalente de ácido gálico

Os resultados obtidos no ensaio de viabilidade celular usando o método de exclusão do azul de tripano e o método de redução de tetrazólio (MTT) para calcular o IC50 (55,2 μg/mL) são mostrados na Tabela 2. O tratamento com 2,91 μg/μL de EECRP por 72 horas resultou na inibição do crescimento em 71,80% em relação ao controle, a maior atividade citotóxica observada entre os grupos de tratamento.

Tabela 2
Ensaio de viabilidade celular pelo método Trypan Blue e valores de concentração que inibem 50% da viabilidade celular (IC50) em células de osteossarcoma canino tratadas com extrato etanólico de cascas recicladas de pequi (Caryocar brasiliense, Camb) - EECRP. Os resultados são expressos em porcentagens médias em relação ao grupo controle em µg/µL, juntamente com o desvio padrão (DP) e valores convertidos de acordo com as unidades padrão internacional (µg/mL).

O ensaio de sobrevivência celular foi utilizado para avaliar a capacidade de proliferação celular após o tratamento com EECRP. As frações de sobrevivência calculadas mostraram que a proliferação celular após o tratamento foi menor em 3.33% no grupo tratado por 72 horas com EECRP 2,91 µg/µL. Por outro lado, a proliferação atingiu 87,5% no grupo tratado por 48 horas com EECRP 0,29 µg/µL. Com 24 horas de exposição, porém, não houve diferença significativa entre as diferentes concentrações de EECRP (F =2,92, p>0,05). Por outro lado, em 48 e 72 horas de exposição, a sobrevivência das células tratadas com concentração de EECRP de 2,91 µg/µL foi significativamente diferente das demais. No entanto, para as células tratadas com EECRP 2,91 µg/µL, não encontramos diferença estatisticamente significativa em relação aos tempos de exposição.

Os dados obtidos nos ensaios de viabilidade celular e sobrevivência celular mostraram que as maiores atividades citotóxicas e antiproliferativas foram observadas em células tratadas com 2,91 µg/µL para diferentes tempos de exposição. Por esse motivo, essa dosagem foi utilizada na investigação do mecanismo de morte celular promovido por EECRP em células D-17 de osteossarcoma canino utilizando o ensaio de dupla marcação com anexina V-FITC e iodeto de propídio. Os valores médios das porcentagens celulares das amostras de três réplicas da citometria de fluxo são mostrados na Figura 1. Não houve morte celular por necrose nas células expostas ao EECRP por 24 horas, enquanto as células expostas por 72 horas apresentaram aumento da indução de apoptose em estágio inicial. No entanto, a apoptose tardia predominou em todos os tempos de exposição (97,07 ± 0,25% em 24 horas, 98,80 ± 0,05% em 48 horas e 91,29 ± 0,42% em 72 horas).

Figura 1
Valores de média e desvio padrão (DP) da análise do mecanismo de morte celular promovido pela concentração de 2,91 µg/µL de extrato etanólico a 3% de cascas de pequi recicladas em células D-17 de osteossarcoma canino, utilizando o ensaio double label com anexina V-FITC e iodeto de propídio. O eixo x representa o tempo de exposição ao extrato e o eixo y, a porcentagem de células. Citômetro de fluxo (FACSVerse, BD Biosciences). Letras maiúsculas indicam diferença significativa entre os tipos de morte celular e letras minúsculas indicam diferença significativa entre os tempos de exposição (Tukey's Test, 5%).

Discussão

O maior efeito inibitório no crescimento celular foi observado em células D-17 tratadas com 2,91 µg/µL de EECRP por 72 horas. Em um estudo anterior, um efeito inibitório dependente da concentração de compostos fenólicos do extrato de carqueja (Baccharis trimera) foi relatado em culturas de células tumorais de colo uterino humano. No entanto, a inibição foi mais acentuada (86%) e mais rápida (24 h) do que no presente estudo. Provavelmente, isso se deve aos compostos fenólicos concentrados extraídos da planta utilizada nesse ensaio, ao contrário do extrato bruto utilizado no presente experimento(7)7 De Oliveira CB, Comunello LN, Maciel ÉS, Giubel SR, Bruno AN, Chiela ECF, Lenz G, Gnoatto SCB, Buffon A, Gosmann G. The inhibitory effects of phenolic and terpenoid compounds from Baccharis trimera in SiHa cells: Differences in their activity and mechanism of action. Molecules. 2013;18(9):11022–32. Available from: https://10.3390/molecules180911022
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Vale ressaltar que em todas as doses testadas, os efeitos inibitórios do EECRP se manifestaram somente após 72 horas. Isso pode ser devido à presença de fenóis, incluindo os flavonoides antioxidantes(8)8 Ullah A, Munir S, Badshah SL, Khan N, Ghani L, Poulson BG, Emwas AH, Jaremko M. Important flavonoids and their role as a therapeutic agent [Internet]. Vol. 25, Molecules. 2020. p. 5243. Available from: https://10.3390/molecules25225243
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, no extrato (Tabela 1), que podem ter conferido efeito protetor sobre a viabilidade de células tratadas com concentração máxima de 0,29 µg/µL ou com 24 horas de exposição.

A concentração total do EECRP bruto usado neste experimento mostrado na Tabela 1 foi de 29,19 g/L, o que equivale a 29,19 mg/mL ou 29,2 μg/μL. Assim, doses de 0,1, 1 e 10 μL continham 2,92, 29,2 e 291,2 μg de solutos totais, respectivamente. Isso é comparável à dose usada para o extrato de Casearia sylvestris (“Guaçatonga”), que inibiu o crescimento de células de câncer de mama humano MCF-7 em 20%, ao serem utilizados 2 μg/ml de extrato, e em até 80% ao tratarem-se células com 18 μg/mL de extrato por 24 horas(9)9 Felipe KB, Kviecinski MR, Da Silva FO, Bücker NF, Farias MS, Castro LSEPW, De Souza Grinevicius VMA, Motta NS, Correia JFG, Rossi MH, Pedrosa RC. Inhibition of tumor proliferation associated with cell cycle arrest caused by extract and fraction from Casearia sylvestris (Salicaceae). J Ethnopharmacol. 2014;155(3):1492–9. Available from: https://10.1016/j.jep.2014.07.040
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. Para comparação, no presente estudo, o EECRP prrpoporcionou 55,24% de inibição de crescimento com 2,91 μg/μL. Em outro estudo, o tratamento de células de melanoma cutâneo com extrato de mangostão (Garcinia mangostana) reduziu significativamente o número de células neoplásicas em dosagens entre 1,0 e 5,0 mg/ml(10)10 Cunha BLA, de França JP, Moraes AA de FS, Chaves ALF, Gaiba S, Fontana R, do Sacramento CK, Ferreira LM, de França LP. Evaluation of antimicrobial and antitumoral activity of Garcinia mangostana L. (Mangosteen) grown in Southeast Brazil. Acta Cir Bras. 2014;29(suppl 2):21–8. Available from: https://10.1590/S0102-86502014001400005
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, comparável ao resultado mais favorável obtido com o pequi. Comparar a eficácia e potência de produtos naturais é importante, mas deve-se considerar a resposta intrínseca das diferentes linhagens celulares, que certamente varia com cada tipo neoplásico.

Comprovou-se neste estudo que o pequi, planta essencial no Cerrado brasileiro, contém compostos que possuem efeitos inibitórios sobre a viabilidade celular, ou seja, efeitos antiproliferativos. A maioria das pesquisas sobre princípios ativos antineoplásicos da flora brasileira tem focado e contemplado o uso de vegetação de outros biomas, enquanto trabalhos com plantas do Cerrado, apesar de sua biodiversidade, são raros na literatura científica. Por exemplo, células de carcinoma espinocelular humano foram testadas com 72 extratos diferentes de plantas encontradas na Amazônia e na Mata Atlântica(11)11 Ozi JM, Suffredini IB, Paciencia M, Frana SA, Dib LL. In vitro cytotoxic effects of Brazilian plant extracts on squamous cell carcinoma of the oral cavity. Braz Oral Res. 2011;25(6):519–25..

Embora o tratamento de 72 horas tenha apresentado diferença significativa em relação à inibição da proliferação celular, não houve diferença significativa nos valores de IC50. Uma possível explicação é que o extrato, além de componentes que causam dano celular, apresentava antioxidantes(8)8 Ullah A, Munir S, Badshah SL, Khan N, Ghani L, Poulson BG, Emwas AH, Jaremko M. Important flavonoids and their role as a therapeutic agent [Internet]. Vol. 25, Molecules. 2020. p. 5243. Available from: https://10.3390/molecules25225243
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que poderiam manter a integridade celular, pelo menos por um determinado período. Assim, a ação do EECRP poderia ser mais dependente do tempo de exposição do que da dosagem.

Os valores médios de IC50 encontrados neste experimento podem parecer altos em comparação aos relatados para outros extratos vegetais para promover citotoxicidade em células neoplásicas. O extrato comercial de Artemisia annua (absinto anual) apresentou IC50 de 65 μM em células D-17(12)12 Isani G, Bertocchi M, Andreani G, Farruggia G, Cappadone C, Salaroli R, Forni M, Bernardini C. Cytotoxic Effects of Artemisia annua L. And pure artemisinin on the D-17 canine osteosarcoma cell line. Oxid Med Cell Longev. 2019;2019. Available from: https://10.1155/2019/1615758
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, valor muito inferior aos encontrados no presente estudo. No entanto, isso pode estar relacionado à concentração de artemisinina encontrada em A. annua. Considerando a concentração de artemisinina no extrato de 2 mg/ml ou 7 mM, e a quantidade máxima de artemisinina encontrada na planta (0,45%), pode-se inferir que o valor de IC50 foi de 185 µg/ml calculado a partir da concentração do total solutos. O valor de IC50 do extrato de pequi, nessa perspectiva, portanto, pode ser inferior ao obtido para A. annua.

Uma consideração importante para determinar a citotoxicidade do EECRP usado nesta pesquisa é o método de extração. O EECRP foi elaborado para garantir a máxima extração de fenóis, que possuem propriedades antioxidantes(13)13 De Oliveira TS, Thomaz DV, da Silva Neri HF, Cerqueira LB, Garcia LF, Gil HPV, Pontarolo R, Campos FR, Costa EA, Dos Santos FCA, De Souza Gil E, Ghedini PC. Neuroprotective effect of caryocar brasiliense camb. leaves is associated with anticholinesterase and antioxidant properties. Oxid Med Cell Longev. 2018;2018:9842908. Available from: https://10.1155/2018/9842908
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. Se outros métodos de extração tivessem sido usados, o IC50 poderia ter sido menor do que o medido para todos os tempos de exposição. Este argumento é apoiado por um relato no qual a fração diclorometano rica em antraquinona apresentou a maior atividade anticancerígena quando avaliada na linhagem celular de câncer de hepatoma humano HepG2, em comparação com extratos obtidos usando n-hexano, etil acetato, n-butanol ou água como solventes(14)14 Eom T, Kim E, Kim JS. In vitro antioxidant, antiinflammation, and anticancer activities and anthraquinone content from rumex crispus root extract and fractions. Antioxidants. 2020;9(8):1–13. Available from: https://10.3390/antiox9080726
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.

Outro fator crucial a ser levado em consideração é o tipo de célula utilizada. É provável que estudos futuros usando diferentes células tumorais relatem valores de IC50 significativamente diferentes para EECRP, em comparação com células de osteossarcoma canino D-17 usadas neste estudo. Esta possibilidade é corroborada pelos diferentes valores relatados de IC50 (μg/mL) do uso do mesmo extrato bruto do caule de Paullinia pinnata L. (Sapindaceae), nativo da África, para inibir o crescimento de células neoplásicas de diferentes linhagens(15)15 Spiegler V, Greiffer L, Jacobtorweihen J, Asase A, Lanvers-Kaminsky C, Hempel G, Agyare C, Hensel A. In vitro screening of plant extracts traditionally used as cancer remedies in Ghana – 15-Hydroxyangustilobine A as the active principle in Alstonia boonei leaves. J Ethnopharmacol. 2021;265:113359. Available from: https://10.1016/j.jep.2020.113359
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: HepG2 (câncer de fígado - 42,8), MCF-7 (câncer de mama - 43,1), MDA-MB231 (câncer de mama - 73,8), A431 (câncer de pele - >100), AGS (câncer de estômago - 47,6) e LNCap (câncer de próstata - 47,2).

Paradoxalmente, os metabólitos do EECRP que podem ter efeitos citotóxicos são os próprios fenóis. O extrato da popular carqueja (Baccharis trimera) apresentou efeito antiproliferativo contra células cancerígenas do colo do útero humano após 24 horas de tratamento. Além disso, o IC50 foi calculado para a fração fenólica do extrato em 482 μg/mL(7)7 De Oliveira CB, Comunello LN, Maciel ÉS, Giubel SR, Bruno AN, Chiela ECF, Lenz G, Gnoatto SCB, Buffon A, Gosmann G. The inhibitory effects of phenolic and terpenoid compounds from Baccharis trimera in SiHa cells: Differences in their activity and mechanism of action. Molecules. 2013;18(9):11022–32. Available from: https://10.3390/molecules180911022
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. Considerando a análise do EECRP apresentada na Tabela 1, a fração correspondente aos taninos pode ser o grupo fenólico responsável pelos efeitos citotóxicos do EECRP.

Conforme observado neste estudo, o teor de tanino do EECRP foi de 22,23% do total de fenóis do extrato. Comparativamente, em um estudo realizado com células de neoplasia mamária 4T1-luc2, foi testada a atividade antitumoral do weimaining (WMN). WMN é um composto de tanino condensado extraído das raízes do trigo sarraceno Fagopyrum cymosum (Trevir.) Meisn., um fitoterápico de origem chinesa(16)16 Ke H, Wang X, Zhou Z, Ai W, Wu Z, Zhang Y. Effect of weimaining on apoptosis and Caspase-3 expression in a breast cancer mouse model. J Ethnopharmacol. 2021;264:113363. Available from: https://10.1016/j.jep.2020.113363
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. Os resultados mostraram aumento tempo-dependente da apoptose das células tumorais, semelhante à diminuição da viabilidade celular causada por 72 horas de tratamento com EECRP, sugerindo que os taninos desempenham um papel crucial na redução da viabilidade celular.

Em relação aos resultados do ensaio de sobrevivência celular, o crescimento celular foi reduzido após o tratamento com 2,91 µg/µL em diferentes tempos de exposição, reforçando ainda mais o potencial antitumoral do EECRP. Da mesma forma, a proliferação de células D-17 expostas a 2 μM de um complexo de platina com tris-(2-carboxietil)-fosfina foi reduzida em 53,79% ± 5,15% após duas semanas(17)17 Henklewska M, Pawlak A, Kutkowska J, Pruchnik H, Rapak A, Obminska-Mrukowicz B. In vitro effects of the activity of novel platinum (II) complex in canine and human cell lines. Vet Comp Oncol. 2019;17(4):497–506. Available from: https://10.1111/vco.12511
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.

As atividades antineoplásicas dos compostos bioativos encontrados nas frutas têm despertado constantemente a atenção da comunidade científica, principalmente quanto ao tipo de morte celular que essas substâncias podem promover. No presente estudo, a concentração promissora de EECRP, 2,91 µg/µL, promoveu um elevado percentual de apoptose nas células D-17. O mesmo tipo de morte celular foi observado nas linhagens neoplásicas HepG-2 (fígado), Caco-2 (cólon) e MCF-7 (mama) expostas ao extrato da fruta Annona squamosa(18)18 Shehata MG, Abu-Serie MM, Abd El-Aziz NM, El-Sohaimy SA. Nutritional, phytochemical, and in vitro anticancer potential of sugar apple (Annona squamosa) fruits. Sci Rep. 2021;11(1):6224. Available from: https://10.1038/s41598-021-85772-8
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, cujo conteúdo fenólico total variou de 70,14 ± 3,89 a 284 ± 2,12 µg GAE/g, enquanto que a quantidade de flavonoides encontrada na casca da fruta foi de 81,27 ± 1,74 µg EQ equivalente/g. Além disso, a fração de tanino de Terminalia bellirica induziu apoptose em xenoenxertos de carcinoma hepatocelular em camundongos(19)19 Chang Z, Jian P, Zhang Q, Liang W, Zhou K, Hu Q, Liu Y, Liu R, Zhang L. Tannins in: Terminalia bellirica inhibit hepatocellular carcinoma growth by regulating EGFR-signaling and tumor immunity. Food Funct. 2021;12(8):3720–39. Available from: https://10.1039/d1fo00203a
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, reforçando a hipótese de que a fração de tanino pode ser o grupo fenólico responsável pelos efeitos apoptóticos do EECRP.

A indução de apoptose por substâncias químicas ou biológicas em qualquer tipo de neoplasia é um objetivo central dos estudos antitumorais atuais(20)20 Yang HL, Liu HW, Shrestha S, Thiyagarajan V, Huang HC, Hseu YC. Antrodia Salmonea Induces Apoptosis and Enhances Cytoprotective Autophagy in Colon Cancer Cells. Aging (Albany NY). 2021;13(12):15964–89. Available from: https://10.18632/aging.203019
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, pois esse processo de morte celular ocorre sem inflamação secundária(21)21 Chaudhry GES, Islamiah M, Zafar MN, Bakar K, Aziz NA, Saidin J, Sung YY, Muhammad TST. Induction of Apoptosis by Acanthaster planci sp., and Diadema setosum sp., Fractions in Human Cervical Cancer Cell Line, HeLa. Asian Pacific J Cancer Prev. 2021;22(5):1365–73. Available from: https://10.31557/APJCP.2021.22.5.1365
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ou possível dano às células normais adjacentes. Trabalhos anteriores mostraram que a apoptose também foi observada em células D-17 tratadas com compostos bioativos com capacidade antioxidante. Estes incluem luteolina (uma molécula de flavonoide encontrada em frutas e vegetais)(22)22 Ryu S, Park S, Lim W, Song G. Effects of luteolin on canine osteosarcoma: Suppression of cell proliferation and synergy with cisplatin. J Cell Physiol. 2019;234(6):9504–14. Available from: https://10.1002/jcp.27638
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, miricetina (um antioxidante encontrado em bagas)(23)23 Park H, Park S, Bazer FW, Lim W, Song G. Myricetin treatment induces apoptosis in canine osteosarcoma cells by inducing DNA fragmentation, disrupting redox homeostasis, and mediating loss of mitochondrial membrane potential. J Cell Physiol. 2018;233(9):7457–66. Available from: https://10.1002/jcp.26598
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, extrato de açafrão (rico em curcuminóides) e extrato de folhas de alecrim (rico em ácido carnósico)(24)24 Levine CB, Bayle J, Biourge V, Wakshlag JJ. Cellular effects of a turmeric root and rosemary leaf extract on canine neoplastic cell lines. BMC Vet Res. 2017;13(1). Available from: https://10.1186/s12917-017-1302-2
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.

Não houve morte celular por necrose nas células expostas ao EECRP por 24 horas, enquanto as células expostas por 72 horas apresentaram maior indução de apoptose em estágio inicial. No entanto, a apoptose tardia predominou em todos os tempos de exposição. A apoptose ocorre em resposta a vários estímulos, incluindo aqueles que podem ativar a via apoptótica intrínseca pela liberação do citocromo c das mitocôndrias. O citocromo c liga-se a proteínas no citosol e ativa a caspase para promover a morte celular(25)25 Jiang X, Wang X. Cytochrome C-mediated apoptosis [Internet]. Vol. 73, Annual Review of Biochemistry. 2004. p. 87–106. Available from: https://10.1146/annurev.biochem.73.011303.073706
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. Em outro estudo com células D-17, a ß-lapachona, um composto isolado da serragem da madeira de Ipê (Tabebuia spp.), também nativa do Cerrado brasileiro, promoveu morte celular pela via apoptótica intrínseca em estágio inicial, que foi relacionada à ruptura das membranas mitocondriais(26)26 Cruz VS, Rodrigues FA, Braga KMS, Machado PA, Filho CB, Prado YCL, Araújo EG. β Lapachone blocks the cell cycle and induces apoptosis in canine osteosarcoma cells1. Pesqui Vet Bras. 2018;38(12):2224–32. Available from: https://10.1590/1678-5150-PVB-5524
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. Notavelmente, a concentração com os melhores resultados (1,0 µM de ß-lapachona ou 2,42 µg/µL) foi menor do que a utilizada para o pequi (2,91 µg/µL). Por outro lado, a curcumina, substância isolada da Curcuma longa, amplamente encontrada no bioma Cerrado, induziu apoptose extrínseca em células D-17 pela ativação da caspase na concentração de 50 µM ou 0,20 µg/µL(27)27 Soares NP, Nepomuceno LL, Cruz V de S, Arnhold E, Vieira V de S, Borges JC de A, Pereira DKS, Pereira KF, Araújo EG de. Curcumina promove apoptose extrínseca em células de osteossarcoma canino. Res Soc Dev. 2020;9(10):e7289109231. Available from: https://10.33448/rsd-v9i10.9231
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. Considerando que a ß-lapachona e a curcumina foram utilizadas em suas formas puras, os resultados positivos obtidos com o extrato bruto de pequi no presente estudo podem ser considerados notáveis.

O principal achado desta pesquisa é que o extrato etanólico de cascas recicladas de pequi inibiu a proliferação de células de osteossarcoma canino por meio de apoptose. Este é um relatório inédito e solidifica a importância da identificação dos componentes do EECRP para o potencial desenvolvimento de drogas antitumorais. Ao longo da história da pesquisa biomédica, outros compostos de frutas e vegetais foram identificados como fontes valiosas de drogas antitumorais. Exemplos clássicos incluem os alcaloides da vinca, taxanos e camptotecinas, que foram originalmente extraídos de Catharanthus roseus (Madagascar), Taxus brevifolia (Pacífico) e Camptotheca acuminata (China), respectivamente(28)28 Mans DRA, Rocha AB, Schwartsmann G. Anti‐Cancer Drug Discovery and Development in Brazil: Targeted Plant Collection as a Rational Strategy to Acquire Candidate Anti‐Cancer Compounds. Oncologist. 2000;5(3):185–98. Available from: https://10.1634/theoncologist.5-3-185
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.

O bioma Cerrado, patrimônio natural da humanidade, pode fazer parte dessa história de sucesso na terapêutica antineoplásica. Estudos futuros para o desenvolvimento de drogas antitumorais podem utilizar o subproduto do pequi, abordagem pautada pelos princípios da sustentabilidade.

Conclusão

O tratamento com 2,91 µg/µL de extrato etanólico de cascas recicladas de pequi (Caryocar brasiliense, Camb.) reduz a viabilidade e sobrevivência em células de osteossarcoma canino D-17 in vitro ao promover apoptose. Esses resultados são sugestivos de que o EECRP pode se tornar uma alternativa eficaz e sustentável para o desenvolvimento de terapia antineoplásica em osteossarcoma canino e humano.

Agradecimentos

Agradecemos à CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) pelas bolsas concedidas aos autores KMSB e VSC e CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) pela bolsa de pesquisa concedida à EGA.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    13 Dez 2021
  • Aceito
    15 Fev 2022
  • Publicado
    15 Mar 2022
Universidade Federal de Goiás Universidade Federal de Goiás, Escola de Veterinária e Zootecnia, Campus II, Caixa Postal 131, CEP: 74001-970, Tel.: (55 62) 3521-1568, Fax: (55 62) 3521-1566 - Goiânia - GO - Brazil
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